Chefs On Fire - Santarém

As diferenças culturais em volta do fogo até podem ser várias, mas uma coisa parece comum a todas: a emoção que é ver grandes labaredas transformar completamente o que tocam.


Como boa parte das crianças brasileiras nascidas nos anos 90, os churrascos em a família, o cheiro da fumaça e o som dos pagodes embalou boa parte da minha infância e, recém chegada a Portugal, percebi que a cultura do churrasco (ou dos grelhados no fogo) também está muito presente por cá (embora, me arrisco a dizer, a trilha sonora por aqui seja menos boa).

 

As diferenças culturais em volta do fogo até podem ser várias, mas uma coisa parece comum a todas: a emoção que é ver grandes labaredas transformar completamente o que tocam: as texturas, os cheiros, os sabores. Há quem possa pensar que é fácil cozinhar desta forma, que basta colocar uma peça de carne (ou um vegetal) perto das chamas e dali alguns minutos está pronto e bom para comer, mas a experiência que tive ao visitar o Chefs on Fire Santarém (versão pop-up do festival que acontece em Cascais em Setembro) provou o quanto essa suposição está errada.

 

A filosofia do festival é bastante simples: chefs convidados cozinham exclusivamente com fogo, fumo e lenha, mas o resultado está longe de ser simplório. A começar pelo local escolhido: no Jardim Portas do Sol há muralhas de pedra que parecem quase tão antigas quanto a própria técnica utilizada no festival. A decoração é outro ponto alto, os móveis reaproveitados, as mesas comunais gigantescas e os sofás espalhados pelo relvado dão um ar aconchegante e surreal a todo o ambiente. Quase como uma casa de vó (que não está muito bem, visto que colocou a poltrona no jardim).

Mas o mais impressionante são, de longe, os fire pits. Estruturas enormes de ferro que abrigam, pendurados, os ingredientes que estão a ser (ou serão) preparados. A beleza dos vegetais pendurados, dos pêssegos na grelha, do peixe na telha… é mesmo impressionante. Há aqui equipas inteiras em um equilíbrio perfeito para cozinhar e servir as suas delícias fora do ambiente habitual da cozinha.

Nesta versão pop-up, o festival teve duração de 3 dias, cada um com 4 chefs de renomados restaurantes do país convidados especificamente para prepararem um prato de peixe, um prato de carne, um prato vegetariano e uma sobremesa. Este ano os chefs responsáveis pelos pratos foram Jorge Castelo (Ó Balcão), João Francisco Duarte (Soão), João Saloio (Mãe) e Diogo Caetano (Terruja).

Decidimos por iniciar pelo prato de peixe. O chef Rodrigo Castelo do estrelado Ó Balcão (de Santarém), fez uma Fataça na telha que estava divina! É difícil de explicar esse prato, porque nunca havia comido peixe com essas texturas; pense em uma carne de panela (a melhor carne de panela que já comeu), com aquele molho delicioso de horas de cozimento e batatas cozidas nesse molho - só que com peixe! Foi mesmo surpreendente e logo vimos que seria difícil os outros pratos superarem este. Começamos pelo melhor, sem dúvida.

Depois partimos para o prato de carne: um taco de porco acompanhado de pico de galo, guacamole, abacaxi e lima. Estava também delicioso! A seguir provamos o prato vegetariano. Um arroz frito com couves portuguesas foi também uma agradável surpresa visto que arroz não seria o que eu imaginaria encontrar sendo feito num fire pit, mas resultou muito bem! As couves aguentam bem o calor sem perder a crocância que, junto ao arroz muito bem temperado, fez deste um prato vegetariano uma opção que não fica atrás das versões de peixe e carne. Por fim, fomos à sobremesa, que contou com pêssegos grelhados no fogo junto com uma calda bastante doce e um creme. O fogo conferiu à pele dos pêssegos uma textura diferente e o chamuscado acrescentou mais complexidade à fruta que está no seu melhor nesta época do ano.

O Chefs on Fire Santarém não foi um churrasco, não houve pagode, nem grandes pedaços de carne distribuídos à mesa. Foi uma coisa completamente nova, diferente do que imaginava quando pensava em cozinhar com fogo. Foi definitivamente uma experiência única e muito interessante que despertou aqui uma vontade de fazer deste festival (nas versões pop-up ou não) uma constante neste meu tempo aqui em Portugal.

 

Artigo escrito por Camila Vilar

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